Texto manteve 'neutralidade' e desobrigou guarda de dados no Brasil. Priorit�rio para o Planalto, projeto seguir� agora para an�lise do Senado.

Ap�s meses de intensas negocia��es, a C�mara dos Deputados aprovou nesta ter�a-feira (25), por vota��o simb�lica, a cria��o do Marco Civil da Internet, projeto considerado uma esp�cie de constitui��o da rede mundial de computadores. Ap�s concess�es do governo em pontos antes considerados "cruciais" pelo Planalto, partidos aliados e da oposi��o retiraram todas as 12 propostas de altera��o ao texto que haviam sido apresentadas em plen�rio.
At� o PMDB, maior cr�tico ao relat�rio do deputado Alessandro Molon (PT-RJ), cedeu e se absteve de defender quaisquer modifica��es na reda��o. A proposta, que estabelece direitos e deveres de usu�rios e provedores de rede, seguir� agora para an�lise no Senado antes de ir � san��o presidencial.
Considerado "prioridade" pelo governo, o Marco Civil da Internet impedia a delibera��o de outros projetos de lei no plen�rio desde outubro do ano passado, j� que tramitava em regime de urg�ncia.
Neutralidade
Um dos pilares do projeto, a neutralidade de rede, sofreu algumas altera��es no texto, mas foi mantido. Por esse princ�pio, os provedores n�o podem ofertar conex�es diferenciadas, por exemplo, para acesso somente a emails, v�deos ou redes sociais. O principal entrave estava na regulamenta��o do princ�pio pelo Poder Executivo, principalmente em rela��o �s exce��es � norma.
O texto original previa que a neutralidade fosse regulamentada por meio de decreto presidencial.
Partidos da oposi��o e da base aliada, sobretudo o PMDB, temiam que assim o presidente da Rep�blica fizesse altera��es significativas sem ouvir o Congresso. Para obter acordo, Molon especificou que o tema seria regulamentado "para fiel execu��o desta lei", sem autonomia para grande modifica��o por parte do presidente.
O objetivo � destacar que a regulamenta��o serve exclusivamente para viabilizar a aplica��o da Lei do Marco Civil da Internet. Al�m disso, o relator incluiu ainda a obrigatoriedade de o presidente ouvir a Ag�ncia Nacional de Telecomunica��es (Anatel) e o Comit� Gestor da Internet (CGI) antes de formular o decreto.
De acordo com o relator do texto, as exce��es servir�o para garantir prioridade a "servi�os de emerg�ncia" e a qualidade de algumas transmiss�es, como v�deos ao vivo. Assim, a transmiss�o de e-mails, por exemplo, pode ter menor prioridade no tr�fego de dados em prol de outros servi�os.
Cr�ticos da neutralidade dizem que o princ�pio restringe a liberdade dos provedores para oferecer conex�es diferenciadas conforme demandas espec�ficas de clientes e que sua aplica��o obrigat�ria pode encarecer o servi�o para todos indistintamente. A proposta n�o impede a oferta de pacotes com velocidade diferenciada.
Armazenamento de dados
Para viabilizar a aprova��o da proposta, o governo tamb�m abriu m�o do armazenamento no Brasil de dados de usu�rios brasileiros, com a instala��o de data centers no pa�s de empresas de internet, como o Google e o Facebook.
A medida tinha o objetivo de garantir a privacidade dos internautas e de dados do pr�prio governo brasileiro diante das den�ncias de que os Estados Unidos teriam espionado comunica��es da presidente Dilma Rousseff com ministros e assessores.
No entanto, parlamentares da base aliada se opunham � proposta argumentando que a exig�ncia iria encarecer o acesso na internet. Para obter acordo, o relator da proposta, Alessandro Molon (PT-RJ), retirou esse trecho do projeto, com o aval do Planalto, mas refor�ou que empresas internacionais precisam respeitar a legisla��o brasileira no tocante a transmiss�es de rede ocorridas no pa�s.
"Em qualquer opera��o de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados pessoais ou de comunica��es por provedores de conex�o e de aplica��es de internet em que pelo menos um desses atos ocorram em territ�rio nacional, dever� ser obrigatoriamente respeitada a legisla��o brasileira, os direitos � privacidade, � prote��o dos dados pessoais e ao sigilo das comunica��es privadas e dos registros", diz artigo do projeto do Marco Civil.
Retirada de conte�do
De acordo com o projeto, provedores de conex�o � web e aplica��es na internet n�o ser�o responsabilizados pelo uso que os internautas fizerem da rede e por publica��es feitas por terceiros.
Atualmente n�o h� regras espec�ficas sobre o caso e as decis�es judiciais variam - alguns ju�zes punem sites como o Facebook e Google por p�ginas ofensivas criadas por usu�rios, enquanto outros magistrados optam por penalizar apenas o respons�vel pelo conte�do.
De acordo com a nova legisla��o, as entidades que oferecem conte�do e aplica��es s� ser�o responsabilizadas por danos gerados por terceiros se n�o acatarem ordem judicial exigindo a retirada dessas publica��es. O objetivo da norma, segundo Molon, � fortalecer a liberdade de express�o na web e acabar com o que chama de "censura privada".
O trecho era alvo de pol�mica, sobretudo entre parlamentares do PMDB. Para o partido, esse artigo ajuda os provedores, mas prejudicar� pessoas que eventualmente se sintam constrangidas por algum conte�do publicado que seja evidentemente ilegal. Isto porque os provedores poder�o n�o se sentir obrigados a retirar o conte�do ap�s a mera notifica��o do usu�rio, j� que eles ter�o a garantia de que s� ser�o responsabilizados se descumprirem ordem judicial exigindo a indisponibilidade da publica��o.
Fim do marketing dirigido
Pelo texto aprovado, as empresas de acesso n�o poder�o "espiar" o conte�do das informa��es trocadas pelos usu�rios na rede. H� interesse em fazer isso com fins comerciais, como para publicidade, nos moldes do que Facebook e Google fazem para enviar an�ncios aos seus usu�rios de acordo com as mensagens que trocam.
Essas normas n�o permitir�o, por exemplo, a forma��o de bases de clientes para marketing dirigido, segundo Molon. Ser� proibido monitorar, filtrar, analisar ou fiscalizar o conte�do dos pacotes, salvo em hip�teses previstas por lei.
Sigilo e privacidade
O sigilo das comunica��es dos usu�rios da internet n�o pode ser violado. Provedores de acesso � internet ser�o obrigados a guardar os registros das horas de acesso e do fim da conex�o dos usu�rios pelo prazo de seis meses, mas isso deve ser feito em ambiente controlado.
A responsabilidade por esse controle n�o dever� ser delegada a outras empresas.
N�o fica autorizado o registro das p�ginas e do conte�do acessado pelo internauta. A coleta, o uso e o armazenamento de dados pessoais pelas empresas s� poder�o ocorrer desde que especificados nos contratos e caso n�o sejam vedados pela legisla��o.
Relator e l�der do governo defendem projeto
Ap�s a aprova��o, o relator disse acreditar que a C�mara melhorou a proposta do governo. Para Alessandro Molon, apesar das altera��es e concess�es, ficaram garantidos os princ�pios que ele considera pilares do Marco Civil da Internet: a neutralidade na rede, a privacidade e a liberdade de express�o.
"Hoje nada impede que a navega��o do usu�rio seja gravada, identificada e vendida, violando a privacidade do usu�rio. Com o Marco Civil isso n�o poder� acontecer. Tamb�m n�o existe lei que garanta que n�o haver� cobran�a para uso diferenciado do acesso � internet, para quem quiser baixar m�sica, assistir v�deo. O marco pro�be isso e coloca em lei essa proibi��o, algo que nos Estados Unidos caiu no Judici�rio, mas ainda n�o tem lei", explicou.
O l�der do governo na C�mara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), agradeceu pela aprova��o e disse que os deputados superaram preocupa��es de cunho pol�tico e ideol�gico. Ele negou que a lei seja uma forma de o governo intervir na liberdade da internet.
Por Nathalia Passarinho e Felipe N�ri - G1