Cresce número de ações na Justiça pela mudança na correção do FGTS

Reajuste atual do fundo n�o cobre a infla��o e milhares de a��es pedem ressarcimento de perdas; Caixa diz que recorrer� de decis�es contra o FGTS

O Fundo de Garantia por Tempo de Servi�o (FGTS) acumula um desempenho nada animador nos �ltimos 15 anos. De julho de 1999 a fevereiro de 2014, seu reajuste foi de 99,71%, bem abaixo da infla��o no per�odo. O �ndice Nacional de Pre�os ao Consumidor (INPC), por exemplo, acumula alta de 159,24% at� janeiro deste ano, o �ltimo dado dispon�vel.

O saldo do FGTS � atualizado todo dia 10 de cada m�s, respeitando a f�rmula de 3% ao ano mais Taxa Referencial. Na ponta do l�pis, o rombo criado pelo descolamento entre o atual modelo de reajuste e os �ndices de pre�os est� na casa dos bilh�es. S� neste ano, R$ 6,8 bilh�es deixaram de entrar no bolso dos trabalhadores, segundo c�lculos do Instituto FGTS F�cil, organiza��o n�o governamental que presta aux�lio aos trabalhadores. Em 2013, a cifra chegou a R$ 27 bilh�es.

A TR � calculada pelo Banco Central e tem como base a taxa m�dia dos Certificados de Dep�sitos Banc�rios (CDBs) prefixados, de 30 dias a 35 dias, oferecidos pelos 30 maiores bancos do Pa�s. A redu��o da taxa b�sica de juros, a Selic, a partir de 1999, foi diminuindo o valor da TR e fez com que o reajuste do FGTS n�o conseguisse nem repor as perdas com a alta dos pre�os da economia.

A queda mais forte dos juros promovida no in�cio do governo de Dilma Rousseff s� acentuou esse problema. De 2012 para c�, n�o foi raro o momento em que a taxa ficou zerada.

A revers�o dessa pol�tica, com o atual ciclo de aperto monet�rio, j� elevou a Selic para 10,5% ao ano, o que ajuda a recompor um pouco a remunera��o pela TR. Mas � insuficiente para que o FGTS seja reajustado no mesmo ritmo da infla��o.

Uma simula��o do FGTS F�cil aponta que um trabalhador que tinha R$ 10 mil em 1999, e n�o teve mais nenhum dep�sito desde ent�o, teria agora R$ 19.971,69 pela atual regra. O valor subiria para R$ 40.410,97 caso o reajuste considerasse os 3% anuais mais a corre��o da infla��o pelo INPC, uma diferen�a de mais de 100%.

Disputa. De olho nessa rentabilidade perdida, milhares de brasileiros tentam conseguir na Justi�a uma mudan�a na corre��o do fundo. As centrais sindicais tamb�m entraram no jogo e est�o movendo a��es coletivas, geralmente a pre�os mais baixos que os cobrados por advogados em processos individuais.

O volume de a��es come�ou a crescer no ano passado, quando o STF decidiu que a TR n�o poderia ser usada como �ndice de corre��o monet�ria para os precat�rios - t�tulos de d�vida emitidos pelo governo para pagar quem ganhou a��es na Justi�a contra o poder p�blico.

A partir da�, muitos advogados entenderam que esse racioc�nio poderia ser estendido para o debate sobre o FGTS, mas o tema � pol�mico. "O STF disse que a TR n�o � �ndice de corre��o da infla��o, nada al�m disso", afirma Geraldo Wetzel Neto, s�cio do Bornholdt Advogados.

Na semana passada, a Defensoria P�blica da Uni�o (DPU) ajuizou uma a��o civil p�blica na Justi�a do Rio Grande do Sul pedindo que a corre��o do FGTS seja alterada para melhor refletir a perda do poder de compra.

O juiz da 4� Vara Federal de Porto Alegre, Bruno Brum Ribas, j� decidiu que as resolu��es ao longo desse processo ter�o validade em todo o Pa�s. Na avalia��o do magistrado, � preciso reconhecer o alcance nacional da quest�o "sobretudo pela inquestion�vel prolifera��o de demandas da esp�cie j� h� alguns meses em todo o Pa�s".

Vale a ressalva de que, caso os trabalhadores ven�am essa batalha, a diferen�a no reajuste do FGTS valeria n�o s� para aqueles que t�m saldo atualmente, mas tamb�m para quem efetuou resgates desde 1999.

A Caixa Econ�mica Federal, respons�vel pela administra��o do FGTS, acumula mais de 39 mil processos na Justi�a sobre o tema e diz que j� conseguiu vit�ria em 18,3 mil deles.

Neste ano, contudo, come�aram a aparecer as primeiras decis�es favor�veis ao trabalhador. O banco informou, em nota, que "recorrer� de qualquer decis�o contr�ria ao FGTS."

Mas o caminho ainda deve ser longo. A palavra final sobre o tema deve acontecer s� na �ltima inst�ncia do judici�rio brasileiro, o Supremo Tribunal Federal (STF). "� uma tese ainda em in�cio de trajet�ria no poder judici�rio", ressaltou a assessoria de imprensa da DPU. "O julgamento vai ser demorado porque haver� um componente pol�tico quando o tema chegar em Bras�lia", diz Wetzel.

Nas contas do tributarista Carlos Henrique Crosara Delgado, do escrit�rio Leite, Tosto e Barros, a discuss�o s� deve chegar ao Supremo num per�odo de cinco a dez anos. "A tese em discuss�o � a mesma dos planos econ�micos, de que o patrim�nio do trabalhador foi corro�do."

Dinheiro represado. Todos os meses, as empresas s�o obrigadas a depositar o equivalente a 8% do sal�rio do empregado na conta do FGTS. Como a disputa pela mudan�a da corre��o do fundo est� longe de terminar, as perdas continuam a crescer m�s a m�s.

O problema se agrava porque, caso o trabalhador n�o tenha sacado o valor, n�o h� op��o de destinar o dinheiro para uma aplica��o mais vantajosa ou, ao menos, que cubra a infla��o. O dinheiro do fundo pode ser resgatado, por exemplo, em caso de demiss�o sem justa causa, doen�a grave ou compra de im�vel.

Mario Avelino, presidente do Instituto FGTS F�cil, diz que embora as quest�es relativas ao FGTS possam ser questionadas em um per�odo de at� 30 anos, a hora � de tentar recuperar as perdas. "Quanto mais a��es de trabalhadores, mais press�o sobre o judici�rio", afirma.

Embora a percep��o geral seja de que a mar� est� virando a favor dos trabalhadores, alguns especialistas lembram que n�o h� garantias, por enquanto, de vit�ria dos trabalhadores.

Isso porque as decis�es favor�veis at� agora ainda podem ser questionadas. "O trabalhador pode, por exemplo, cair com um juiz que n�o tenha esse racioc�nio e a� ter� de pagar os honor�rios advocat�cios caso perca a a��o�, alerta Delgado.

Apesar dos riscos, vale a ressalva de que o tr�mite na Justi�a, em a��o individual ou coletiva, deve se arrastar por muitos anos. Logo, a decis�o sobre a a��o de um trabalhador pode, eventualmente, coincidir com o per�odo em que o tema estar� em discuss�o no STF.

Por O Estado de S.Paulo